segunda-feira, 22 de junho de 2009

Conspirações em minha casa - CAPÍTULO III

Como se já não bastasse estar ao lado de um lunático, os noticiários não ajudavam muito. Crime por todo lado, uma mulher mata o marido e foge com a filha, fotógrafo retrata os fumadores de crack nas ruas das cidades. Parece que a tendência é tudo estar cada dia pior. Não que eu esteja pessimista, mas como que pode tudo ficar estampado bem na nossa cara. Ainda por cima a sensação de impotência torna-se maior quando sabemos que tudo fica nas mãos da lei e essa, muitas vezes, só tem olhos voltados pra alguns.

Meu inferno astral piora quando vejo Olho de Gato e seus produtos derivados da Colômbia. “Você não tem fim mesmo... porra... há quanto tempo não dorme?” – “É da sua conta? Não posso dormir, as coisas estão cada vez pior!” – “Mas como você pode saber, está trancado aqui e não deixa nem eu comprar jornal!” – “Você deveria ter assinatura de um jornal ao invés de ficar reclamando”.

Questão de tempo pra alguém bater minha porta. Não estava indo ao trabalho, não dava as caras em lugar algum. “Daqui a pouco vem alguém aqui atrás de mim, e aí? Como vamos agir?” – “É fácil, é só não abrir a porra da porta”. Não tinha mais conversa. Pior era estar vigiado por insetos, já ter levado choque do meu próprio celular. Esse cara pensa que é quem, preciso fazer alguma coisa.

“Aí Olho de Gato, vou sair um pouco, não aguento mais” – “Se pisar fora daqui, te mato”. Ele estava muito chapado pra eu duvidar do cara. Sentei numa poltrona e me embalei. Mesmo com ânsia, mandava pra dentro o que meu corpo já repudiava. “Porra cara, essas paredes estão me massacrando!” – “Calma cara, calma, deixa a poeira baixar”. Tudo que ele falava era uma facada na barriga.

...

Toc Toc Toc... “ei irmão! Está aí?”. Sabia que isso iria acontecer. Olho de Gato fez sinal pra eu não dizer nada, mas foda-se. “Quem é?” – “Porra... abre essa porta... é o Fábio” – “Espera um pouco cara... já estou saindo!”. Peguei uma jaqueta e saí... Olho de Gato estava com sangue no olho, mas arrisquei...

“Por onde você anda cara?” – “Vamos nessa, depois te explico”. Saímos e eu sugeri um boteco, era disso que precisava. Andamos umas quadras, eu acelerado e meu camarada só de canto de olho querendo me perguntar algo que eu sabia o que era. “Tá tá cara... estou desse jeito mesmo, não está vendo!” – “Porra... tá festando e nem chama os camarada... é assim?” – “Qual é cara... o que está pensando... acha que eu to numa boa?” – “E não está?” – “Eu to na merda cara... na merda”.

Sentamos no boteco e começamos a beber. “Então... tua gata não para de me encher o saco, não sei mais a desculpa que dou!” – “Pois é... estou sem comunicação por uns dias” – “Você está é sem noção, como isso aconteceu? Se fincar desse jeito!” – “Não posso te falar nada meu chapa, o buraco é mais embaixo!”. Continuamos a beber nossa cerveja. Esse breve momento com meu camarada aliviou um pouco minha paranóia.

...

O boteco estava lotado, pessoas indo e vindo. Muita gente estranha. “Então, vamos nessa?” – perguntou Fábio. “Não cara... está cedo ainda” – “Cara... eu ainda não larguei meu trabalho” – “Eu sei, mas está cedo porra!”. Falei nervoso demais, Fábio se assustou, mas consentiu e ficou pra mais algumas cervejas.

“Aí... tem um cara muito estranho nos olhando” – eu tremi na hora. “Porra... esse cara não me dá sossego!” – “Que cara meu?” – “Nada nada... quem é que está nos olhando?” – “Lá no fundo, perto das mesas de sinuca”. Esperei um pouco e olhei. Era um cara meio estranho, acho que não era Olho de Gato, parece que este disfarce ele não teria a capacidade de fazer. Cabeça raspada, barba por fazer, magro e pelo que percebi chapado de maconha... não era o caso daquele lunático.

Mas uma pulga começou a me coçar. Se Joe Joe Jabadu Junior era angolano, pode ser que aquele careca seja um espião dele. “Vamos ver... acho melhor irmos embora mesmo né!” – “É, está na nossa hora” – “Então vamos nessa”. Saímos fora. Fomos em direção a minha casa, paramos em frente ao prédio, Fábio foi e eu entrava, mas resolvi dar um tempo ali mesmo.

O cara magro passou e seguiu a rua. Fui atrás dele, o segui um pouco. Estava na direção da casa de meu amigo, achei meio estranho... mas segui em frente. Como um ninja, aquele cara pulou o portão da casa do meu amigo, eu parei do outro lado da rua. “Que porra é essa!” – o cara bateu a porta, quando Fábio abriu, só vi os golpes de facada, uma sequencia rápida e profissional, sem chances.

Não sabia o que fazer, minhas pernas começaram a tremer. “Que merda... o que é isso” – pensei em chamar a polícia, mas meu destino já estava traçado, voltar ao apartamento e me encontrar com um lunático com mania de perseguição. Aquele maldito que matou meu amigo empurrou o corpo pra dentro da casa. “Agora é hora de fugir, um jornalista a menos!Um amigo a menos” – saí correndo. Em duas quadras já não tinha mais pernas e meu coração saía pela boca. Percebi o que realmente aconteceu, um grande amigo foi assassinado e eu não fiz nada! Vomitei! Aí vieram as vertigens e tontura. Estava na hora de voltar.

...

Abri a porta como se ela não estivesse trancada, e não estava. Levei um susto. Olhei pra Olho de Gato e ele estava sentado vendo o noticiário. “Resolveu ligar a TV então?” – ele me olhou com raiva, ódio... queria me matar! – “Calma cara, só fui tomar uma gelada com o meu camarada”.

“Sinceramente meu nobre amigo” – Olho de Gato levanta e começava a falar pausadamente – “Estava analisando a situação, vi o noticiário. Sabe que nunca me fez tão bem assistir essa bosta... ou melhor... o que eu sei não vi na bosta da TV, mas conectei a net e dei uma olhada em algumas notícias, depois sim... coloquei num canal de televisão... mas não vi nada que me agradasse, isso em relação ao assunto que está diretamente ligado a você”.

“Vixi... você está ruim ein camarada” – “Não sou seu camarada, até pensei em colocar você na história do jornalismo, afinal, é credibilidade pra um detetive como eu ter uma biografia escrita por um jornalista, não é?” – “Pois é... mas onde você está querendo chegar?” – “Na verdade eu chego aonde eu quero, já você... bom... seus minutos estão prestes a acabar” – “Do que está falando?” – “Olhe a sua volta, não percebeu nenhuma mudança?”.

Olhei meu apartamento. Meu celular estava em cima da mesa, encostei e não dava mais choque. Olhei em cima dos cômodos e não vi os insetos de guerra, com suas câmeras escondidas. “Está de partida?” – “Sim... estou” – “Ótimo” – “Pra quem?” – “Pra todos”. Olho de Gato estava com uma cara muito serena, me preocupou aquele jeito frio que ele não havia demonstrado até então.

“O que está acontecendo?” – perguntei. “Olha, já disse, gostaria de ajudar, tornar você famoso, escrevendo a minha biografia, fazendo um trabalho jornalístico. O fato de você ser um jornalista e eu estar sempre em contato contigo, de certa forma, era importante pra mim, mas agora não é mais...” – “Ué... o que aconteceu? Só por que saí pra tomar uma cerveja?” – “Não cara... não é por isso... já matei gente por menos” – “Então qual é a pira?” – “Você já fez algo fora do jornalismo na sua vida?” – “Não, só sei fazer isso mesmo” – “Então acho melhor eu te matar de vez...” – “Qual é cara!”.

...

Olho de Gato ficou me enrolando até finalmente dizer: “você sabe que sua profissão já era né, jornalista não existe mais... seu diploma não vale pra nada” – “Essa liminar vai ser revertida, eu tenho certeza” – “Acho que dessa vez não vai não” – “Cala boca... claro que vai, minha profissão é importante, somos nós o reflexo da realidade, a tradução de toda essa porra, só nós sabemos traduzir isso pra vocês” – “Mas não é o que pensam os juízes, a lei não pensa assim” – “Não seja irônico, onde está querendo chegar?” – “Quero dizer que vou pra outro país levar minha biografia pra alguém que seja realmente profissional, um jornalista, aqui não existe mais isso” – “Você está de brincadeira não é?” – “Não”.

...

Aquele insano conspirador, aspirador, assassino, espião, terrorista, lentamente tirou sua arma, uma 380, com silenciador, apontou pra mim e mandou uma bala na minha cabeça.