quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Kris & Gás - Assalto ao contrabando


Kris and Gás são dois detetives astutos e alcoólicos. Vivem na terra do contrabando, Oste do Paraná. Lá é onde a sombra dita à lei.

No velho oeste, nas proximidades de uma fronteira insegura, a dupla sobrevive.

Os detetives têm certa margem de mapeamento territorial da região, usam Marechal Cândido Rondon como cidade dormitório, mas percorrem os municípios lindeiros em busca de aventura.

O escritório desses detetives é, como sempre, um boteco. O deles fica perto de uma faculdade chamada Unioeste. Como bons detetives, vivem disfarçados. Já foram muitas coisas e não revelam sua identidade pra ninguém. Vários RG´s, vários CPF´s... talvez eles também sejam procurados pela polícia! Vai saber...

...

No escritório, muita cerveja, música sertaneja (pra disfarçar, pois são punks musicais de carteirinha) e uma pauta!

- Esse ônibus de contrabando! Precisamos ganhar alguma coisa com isso Kris!

Gás aponta pra uma matéria de jornal que revela contrabandistas tacando fogo num ônibus quando foram pegos pela polícia. No ato da prisão de mercadorias a população começou a saquear o que tinha de valor no ônibus. A cidade de Santa Terezinha do Itaipu ferveu, apareceu até no Jornal Nacional.

- O que você está querendo dizer! Que devemos saquear ou botar fogo em ônibus?

Kris coloca a mão no queixo, olha pra cima, cruza as pernas e reflete sobre o plano.

- Bom... aí depende. Sabe como é... podemos fazer os dois...
- Sei lá Gás... você vem com esses papos violentos e no final das contas sobra sempre pros outros.
- Cala a boca seu arrombado, você não aguenta um minuto de porrada comigo cara... se não fosse eu... você já estaria morto.
- Sim... claro... ainda mais quando você bebe né... fica machão... e anda daquele seu jeitinho. Fazendo suas dancinhas...

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Kris fez referência a certa vez em que estavam numa cidade a trabalho. Beberam tanto que não sabiam direito pra onde ir. Kris conhecia melhor o território e Gás estava tão bêbado que não parava de encher seu saco. Então eles começaram a se provocar até que Kris disse que iria correr e se esconder: “cara... se você não calar essa boca vou sair correndo e você não vai conseguir me achar... você não conhece a porra dessa cidade, vai ficar perdido aqui, bêbado, sozinho!”.

Gás travado caminhava igual um retardado... com as pontinhas dos pés, os pulsos moles... os braços pra perto do corpo e a cabeça pendendo pro lado como se pesasse uma tonelada. Ele estava tão bêbado e chato que Kris resolveu fazer o que tinha dito. Então correu e disse que iria sumir e seu parceiro tentou correr atrás, gritando desesperadamente pelas ruas.

Kris se escondia atrás das árvores, dos muros e via seu amigo desesperado. Até que ao atravessar a rua, Gás tropeçou no meio fio da calçada e caiu.

O tombo assustou! Kris foi até ele pra tentar levantar o amigo, eram dois detetives “disfarçados de bêbados”.

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Os dois investigadores acordam por volta das três da tarde, com uma ressaca fodida.
Preparam-se pra ação, carregam suas armas, tomam um café forte, entram no carro e vão em direção ao lago do Itaipu. É lá que o contrabando acontece...

Após alguns minutos na estrada:

- Porra cara... troca um pouco de som – disse Gás sobre o som do carro , rolava um Ramones.
- Cala a boca cara... não enche o saco... estou começando a tremer... acho que preciso beber algo.
- Cara... troca a porra desse som. Coloca um NOFX vai... é bem melhor...
- Como é que é... NOFX melhor que Ramones? Vai tomar no seu cu...
- O que! Você está me mandando tomar no cu?

Estavam nas proximidades da cidade de Entre Rios do Oeste, atravessando uma ponte na entrada do município.

Então Kris mudou a rota e entrou com seu carro numa estradinha que desce pra uma prainha que tem na beira do lago.

- Desce.
- O que?
- Desce do meu carro agora! – gritou.
- Porra cara... só por causa do som?
- É... “só” por causa do som...
- Porra cara...

Gás fez cara de emo e saiu do carro com a cabeça baixa. Ele sabia que seu parceiro iria achar a situação meio estranha e pedir desculpa. A intenção de Gás era que Kris saísse do carro pra entrar e roubá-lo.

Kris se comoveu e foi até Gás pra pedir desculpa e dizer que foi duro demais. Quando ele se afastou do carro e se aproximou do seu parceiro, esse o empurrou e correu até o carro. Após ver seu amigo cair de costas no chão, colocou um cigarro na boca, o óculos e foi dar a partida do carro... mas as chaves não estavam na ignição.

- Mas que merda! – gritou.

Quando olhou pra fora, o carro com os vidros abertos, viu Kris voando pela janela e caindo sobre ele. Começou a pancadaria e Gás conseguiu abrir a porta do caroneiro pra fugir desesperadamente, já que seu amigo estava alucinado, com os olhos esbugalhados...

Gás não conseguiu correr por muito tempo, Kris foi devagar, no trote, atrás do seu amigo. Preparo físico não é o forte de Gás.

Uma passada lenta e descompassada, assim Gás fugia. Olhou pra trás, “já” havia conseguido percorrer uns cinqüenta metros. Kris esperou o momento certo e se aproximou com passadas largas e um voo com os dois pés nas costas do amigo, que caiu de cara na areia que beirava o lago.

- Agora você vai tentar roubar meu carro de novo seu merda?
- Para cara... estou com falta de ar...
- Então toma um pouco de água.

Kris enfiou a cara do amigo na água imunda do lago. Dava o famoso caldinho. Colocava a cabeça na água, esperava uns segundos e tirava. Gás, quase perdendo a consciência, mexia os braços e tentava alcançar alguma coisa pra bater em Kris. Sem alternativas começou a enterrar sua mão na areia e sentiu algo estranho, uma espécie de metal.

Aquilo o deixou mais animado e quando Kris trouxe a cabeça do seu amigo pra fora da água, Gás disse:

- Cara... cara... para para... encontrei algo... encontrei algo...

Kris meteu a cabeça do amigo mais uma vez na água. Logo recuperou a consciência e pensou um pouco sobre o que o amigo havia falado. Resolveu ajudar a pegar o que Gás tentava tirar da areia.

A cena foi cômica porque ele se apoiou nas costas do amigo pra alcançar seu braço e ajudar a tirar o que estava enterrado. No final das contas fazia peso sobre o amigo que não conseguia tirar a cabeça de dentro da água. Quase que Gás passa dessa pra outra. Dizem que sua sorte foi que merda não afunda por muito tempo.

Eles puxaram algo! Era um molinete pra pesca. Kris sentiu umas pesadas nas costas e olhou pra trás... eram os calcanhares do amigo... eram suas últimas ações... ele se deu conta que estava matando Gás, então levantou.

Gás tirou a cabeça da água e começou a tossir. Estava quase roxo.

- Você quer me matar seu filho da puta?
- Cara... dei mais importância pra esse molinete.
- Porra!

...

Os dois se acalmaram. Gás concordou em escutar Ramones (nota do autor... “ainda bem, pois Ramones é bem melhor que NOFX... rs”). Continuaram o trajeto.

- Vamos pra Santa Helena... vamos vender esse molinete – disse Kris.
- O que... você não está vendo! Isto é uma oportunidade! Isso é um indício cara. É óbvio que está havendo contrabando de molinetes nesta região. Por que você acha que isto estaria enterrado?
- Nossa... faz uns trinta anos que são contrabandeados materiais de pesca nesta região...
- Mas não um molinete como esse!
- O que você entende de molinete porra?

Gás olhava o molinete como se fosse um especialista.

...

Chegaram em Santa Helena:

- Cara... preciso beber alguma coisa.
- Olha lá um boteco Kris... estaciona aqui e vai lá comprar alguma coisa pra beber.
- Como é que é? Eu comprar? Porra... tenho que pagar tudo nessa merda?
- Vai lá e cala essa boca cara...

Dessa vez Kris não quis confusão e foi, mesmo contrariado, até o bar. Ao entrar colocou a mão no bolso e viu que estava sem sua carteira! Ficou puto e voltou.

- Ué... cadê o gole?
- Cara... acho que perdi a carteira!
- Não acredito! É muito burro mesmo.
- Acho que foi na hora que estava pra te matar – e deu uma olhada fulminante pra seu amigo. Ele ficou quieto na hora.

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Voltaram ao local da briga. Deram uma procurada e não encontraram nada. Olharam na ponte e viram um senhor pescando.

- Foi ele... tenho certeza – disse Gás.
- Ele o que?
- Aquele pescador lá... foi ele que roubou sua carteira.
- Como assim roubou?
- Ele deve ter vindo aqui e roubou sua carteira porra!
- Mas isso não é roubar... isso é achar.
- Tanto faz cara... vamos lá pegar a carteira de volta.

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Quando se aproximaram do pescador, viram que era um senhor que aparentava uns cinqüenta anos. Muitas vezes os pescadores, devido a muita exposição ao sol, parecem ter mais idade do que realmente têm.

- Boa tarde senhor! – disse educado Kris.
- Passa logo a carteira aí meu chapa! – disse agressivo Gás.

Não sei, pode ser que a falta de bebida no sangue os deixou meio retardados. O pescador fumava um cigarro e do nada se encontrava entre dois retardados, em cima de uma ponte, desarmado, numa terra sem lei, que ele poderia se tornar apenas mais um na estatística.

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A região dos municípios lindeiros no oeste do Paraná é famosa pelo alto índice de violência. Existe mobilização pra que uma polícia mais efetiva atue, porém o poder paralelo nesta região é muito grande.

Dizem que muitas pessoas, principalmente jovens, recebem um salário pra virar‘olheiros’ em pontos estratégicos. O contrabando gera emprego. Falta de perspectiva e esquecimento cultural faz com que uma geração corra atrás do dinheiro fácil.

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Fatos acontecem com certa frequência, como o já citado ônibus queimado pelos próprios contrabandistas. Existe uma máfia muito grande nas margens do Lago do Itaipu. Dizem que a maior parte do material de pesca que vai pro nordeste entra no Brasil através da região lindeira no Oeste do Paraná.

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Kris and Gás estavam numa fase de desilusão. Seus negócios iam pro buraco, não tinham mais clientes e estavam sempre alcoolizados. Agora não pensavam mais em desvendar crimes, já que a polícia era corrupta e sempre dificultava as coisas. O que eles queriam era tirar a sorte grande. O sonho de ambos era interceptar um contrabando, fazer dinheiro com aquilo e sumir do Brasil.

Ao encontrar um molinete enterrado as margens do Lago, Gás viu uma pista. Na verdade pode até ser, mas é algo muito vazio. A falta de esperança em que vivem faz com que uma parcela de sua consciência aposte que essa possibilidade possa realmente ser um indício.

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Viram no pescador uma possibilidade de fonte. Após fazerem perguntas sem sentido e deixar o senhor mais que atordoado, Gás entrou na abordagem mais agressiva.

- O senhor sabe de onde vem esse molinete?
- Sim senhor... sei sim...

Gás olhou pra Kris com olhar de professor.

- Então é melhor falar, senão te mato!
- Senhor, tem uma loja de pesca no centro da cidade. É a única... deve ter vindo de lá!
- Como é que é? Está tirando da minha cara? Este molinete é raro, importado, um clássico molinete pra pescas sofisticadas...
- Calma senhor... na verdade este molinete é igual o meu, pode olhar (e mostrou sua vara de pescar com o equipamento).
- Acho melhor você explicar o que está fazendo com este tipo de molinete...

Kris saiu de perto. Logo Gás pegou o cigarro do pescador, pegou a carteira e a vara de pescar com o equipamento. Por fim, jogou aquele senhor de cima da ponte e veio em direção ao amigo.

- O que foi que você fez? Por que jogou o coroa de cima da ponte cara?
- A qual é... quantas vezes já pulamos dessa ponte quando éramos novos. Não vai acontecer nada com o pescador.
- Quanto conseguiu?
- Pouca coisa... ele realmente não está com sua carteira.
- Ah! Sério?
- Sim... sério... infelizmente, mas eu tentei... você viu que eu tentei.
- Quanto conseguiu?
- Cinco pila.
- O que? – Kris se desesperou... que tipo de gente rouba cinco reais de um pescador!
- Vamos comprar algo pra beber.

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Gás olhou pra uma estrada que estava se aproximando. Uma estrada de chão. E sugeriu:

- Vamos pegar essa estrada aí?
- Será... pra onde ela vai dar?
- Eu não sei... mas vira aí... vai vai... vira logo!
- Tá bom... calma!

Kris foi na pressão e virou. Entraram numa estrada de chão. Já haviam passado por um boteco. Conseguiram comprar uma garrafa de pinga.

No carro, uma vara de pescar, dois molinetes, pinga e cigarros. Os dois deram umas bibiricadas e a marvada já dava o ar da graça no recinto.

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Essa é a amizade! Dois bêbados de pinga, Ramones no talo e 140 km/h. Estrada de chão, poeira pra cima e como se deus existisse, apontou pros dois soldados do apocalipse. Eles avistaram um grande ônibus reluzente. O brilho vindo do veículo parecia que carregava muito ouro.

Esta é a oportunidade. Se existe alguma coisa pra se fazer numa vida sem destino é arriscar. Engatilharam suas armas, viraram um monstro destemido em busca do tesouro. Era a chance de suas vidas.

O ônibus reluzente estava no sentido que se distanciava da estrada principal e logo viraria pra uma estrada paralela a estrada convencional. Kris e Gás estavam na estrada paralela quando avistaram o ônibus. Então foram até a curva de encontro das duas vias, pois lá o ônibus diminuiria a velocidade.

Na hora do encontro, Kris and Gás descarregaram balas e mais balas das suas pistolas no ônibus. Nesses disparos, atingiram o motorista e o veículo capotou.

Então a dupla simplesmente abriu o compartimento de carga do 'bus'. Lá estavam tabletes e mais tabletes de cocaína. Os detetives se olharam e sorriram, carregaram o carro com a salvação mais pura que o homem pode criar. Voltaram pra estrada.

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Agora eles podem comprar tudo e todos. Podem viajar de primeira classe do céu ao inferno. Podem escolher se serão mocinhos ou bandidos.

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Como se deus existisse, tornaram-se patrões dos cabarés em Miami Beach. Com paparazzi pra mostrá-los nas colunas sociais (foto).

Kris and Gás agora realizam seus sonhos!