quarta-feira, 15 de maio de 2013

Chip´s of Love - Capítulo III – É totalmente cerebral



“Abrir a porta do apartamento foi como engatilhar um revolver e mandar uma bala na cabeça de deus. Tudo que queria naquele momento era renascer; sem pudor, sem medo, sem roupa... eu fui ao apartamento totalmente eufórico. Quando me lembro da adrenalina que foi aquela noite; nosso primeiro encontro! Não tenho dúvidas... não há nada que substitua aquela noite” – Otávio Olavo.

...

- Otávio, conte-me como foi o primeiro encontro entre você, sua ex-mulher e mais uma amiga?
- Ok. Mas essa história do ménage a trois foi só mais uma surpresa!
- Como assim?
- A verdade é que quando cheguei ao apartamento só estava minha ex-mulher.
- Sério? E a outra mulher?
- Bom, ela apenas emprestava o apartamento.
- Emprestava? Foram mais vezes por lá então?
- É... por lá foram umas três vezes...
- Tá certo. Então conte da primeira noite!
- É como eu disse, cheguei igual um cachorro louco. Quando abri a porta tocava um Morphine. Conhece essa banda?
- Não.
- Bom... lembro até da música: Super Sex. Sinceramente, eu amo Morphine. Mas quando a vi! Meu... sinceramente... juro por tudo que é sagrado... na minha mente fez-se silêncio. Não escutei nada, nem sinos, nem bateria, nem baixo, nem saxofone. Não ouvia porra nenhuma.
- Sério. E como ela estava?
- Linda! Eu matava até deus por ela. Aquilo foi lindo! Quando abri a porta ela estava de costas, dançava lentamente, na levada da música. E com uma lingerie de couro, se virou pra mim. Olhei aquela maquiagem pesada, olheiras – como se fosse uma modelo junkie da década de noventa -; com cabeços escuros longos e lisos; sua pele branca... meu deus... o que foi aquilo!
- Ora você diz que quer matar deus, ora você clama por ele.
- É pra você ver o tamanho da confusão que isso causa em mim.
- Mas e aí... o que aconteceu?
- Bom... ela sorriu e disse: “oi amor... bem vindo ao nosso novo mundo. Não esqueça, esse novo mundo é só nosso!”.

...

Seu Laércio entrega a Otávio Olavo uma dose de Johnny Walker.

- Pode ser um red?
- Pode ser.
- O que houve meu amigo, por que está cabisbaixo assim? Broxou? – e deu risada.
- O que é isso Laércio, não fale assim com meu amigo.
- Stifen! O que faz aqui?
- Queria ouvir umas boas histórias, então vim procurar nosso grande contador de causos eróticos, nosso amigo Otávio Olavo.
- Pois é meu amigo, mas dessa vez acho melhor você contar algo de bom pra mim, porque hoje só estou aqui pra beber...
- O que é isso meu irmão. O que houve?
- Não quero conversar sobre isso. Prefiro ouvir...

Otávio abaixou a cabeça, olhou pra dose e virou. Logo pediu mais uma; algo habitual. Seu Laércio logicamente preparou mais uma dose pro seu melhor cliente.

Stifen, amigo de Otávio, estava sentado numa mesa no canto do bar. Otávio entrou e foi direto ao balcão, por isso não viu o amigo. Os dois são companheiros de trabalho, publicitários que tem um empreendimento sólido no mundo da comunicação.

O sócio de Otávio Olavo é bem diferente, é daqueles viciados em trabalho. Não importa se é madrugada, não importa quantas horas tem o dia, pra ele, as horas foram feitas pra trabalhar.

Talvez eles se completem, Otávio é o cara que tem ótimas ideias, Stifen é o cara que faz acontecer.

...

- Um novo mundo, totalmente inusitado pra você, é isso?
- Sim... um mundo que só nos dois viveríamos...

Nesse momento Otávio fica com a garganta travada e seus olhos se enchem de lágrima...

- Tem saudade dela?
- Não é só isso. Eu ferrei com nosso esquema todo...
- Tudo bem... antes de você entrar nessa questão, prefiro que fale da primeira noite. Valeu a pena?
- Claro que valeu. Como não valeria? Imagine chegar num apartamento desconhecido e encontrar sua namorada clamando por sexo, escutando Morphine e dançando como uma serpente diabólica?
- Entendo.
- Nas nossas noites, não existia nada melhor que as nossas experiências.
- Deixa-me ver se entendi. Essa foi a primeira noite, certo?
- Certo.
- Mas a princípio, ainda não percebi nada de extraordinário no que me contou...
- Bom, a primeira noite talvez tenha sido a mais normal realmente. Não foi a questão da anormalidade, entende? Foi a transgressão! O diferente! Isso porque levávamos uma vida muito normal!
- Entendo.
- Sabe cara, depois daquele dia, tudo mudou. Não digo que foi uma noite diferente, sexualmente falando. Se for falar disso, essa noite foi a mais normal. Porém o que veio após isso foi fantástico!
- E o que veio depois disso Otávio?
- Olha... nossa vida estava monótona. Aquilo pulsou nossos corações. Foi um sexo tão intenso nessa primeira vez, que nos outros dias nossa relação mudou. Nossa forma de tratar um ao outro mudou. Eu queria a fazer gozar todo momento. Ela queria me fazer gozar todo momento.
- E vocês faziam?
- Olha... o orgasmo é algo estranho. Pra mulher é totalmente cerebral. O homem tem outra relação com o orgasmo. Quando abrimos nossa imaginação naquele apartamento, comecei a entender que precisa existir uma cumplicidade.
- Como assim?
- Cara... as vezes um orgasmo começa pela manhã, com um simples bom dia! Com carinho! E vai acabar com um bom sexo no fim da noite.
- As vezes?
- Sim, nós preparávamos nossa noite durante o dia. Mandávamos mensagens um pro outro. Era tudo criado, era tudo cerebral. Nossa imaginação era aguçada todo momento.
- Vocês sempre transavam de forma inusitada ou também no modo, vamos dizer assim, padrão!
- Por incrível que possa parecer, normalmente era no modo padrão. Mas quando o padrão virava tédio, eis que caía na minha caixa de mensagem um sms “desconhecido”. E não era só o sms, mas o número da mensagem também era diferente. Realmente queríamos nos passar por outras pessoas. As mensagens eram matadoras, atingiam minhas entranhas. Eu sempre ficava no aguardo de mais uma mensagem. No aguardo de quando um número diferente entraria na minha caixa de entrada do celular. Essa espera me deixava doido...
- Imagino que deva gerar uma grande expectativa mesmo!
- Ninguém faz ideia do que era nosso relacionamento!

...

- Otávio, chega de beber, vamos embora – disse Stifen.
- Me solta, não vou sair daqui. Seu Laércio, mais uma dose, por favor.
- Não Laércio, não... chega... ele já passou da cota!

O amigo de Otávio não queria vê-lo pior do que já estava. Tentava evitar o porre. Até porque, até aquele momento, Otávio Olavo não havia dito nada sobre seu relacionamento.

- Porra Otávio, o Stifen está certo, você já bebeu muito. Como vai chegar em casa desse jeito? O que sua mulher vai pensar?
- Eu não tenho mais minha mulher, porra! – disse Otávio enfurecido, com uma voz falhada, como se tivesse um nó na garganta. Ele continuou:
- Não tem mais nada. Não tenho mais nada. Sou um bosta. Um fodido. Um corno fodido...
- Mas o que é isso cara... do que está falando? – disse assustado Stifen.

Tanto o dono do bar quanto o amigo de Otávio gostavam de escutar as histórias de sexo contadas pelo amigo. Essa notícia pegou todo mundo de surpresa.

As histórias explícitas sobre algumas aventuras do casal, das fantasias que realizavam, deixavam todos intrigados e instigados. Mas Otávio Olavo nunca contava a metodologia do casal; como os encontros eram marcados; a maneira que sua ex-mulher criou pra apimentar a relação. Porém agora, depois de tanto beber, esse segredo estava em risco.

- Cara... como assim acabou? Semana passada você contou sobre a ‘oil transa’! Aquela hilária história em que vocês dois estavam de sunga e bike fazendo uma versão pornô do ‘oil man’!
- É, eu sei. Muita coisa pode acontecer no intervalo de poucos dias. Comigo não foi diferente, muita coisa mudou nessas últimas horas. Muita coisa cara... muita coisa... – então Otávio começou a chorar.
- Que porra é essa cara... o que será que aconteceu? – perguntou curioso Seu Laércio pra Stifen.

Enquanto Otávio abraçava seu copo de whisky, olhava pro fundo do vidro, via seu reflexo e chorava compulsivamente, Seu Laércio levantou, fechou o bar – só estavam os três. Também pegou mais dois copos e serviu três doses. Otávio enxugou as lágrimas, olhou pros amigos e disse:

- Eu tenho um trauma...