segunda-feira, 6 de maio de 2013

Chip´s of Love - Capítulo II – Uma prisão em liberdade




Otávio Olavo sai da clínica depois de nove meses. Ansioso, agora aguarda a chegada do seu primo.

Ficou um bom tempo drogado num hospital psiquiátrico. Desligado do mundo. O fizeram esquecer seus traumas. A ineficácia disso só não é percebida momentaneamente pelo medicado.

Já no carro, Otávio tem seu primeiro choque:

- Que porra é essa? – grita ao ver um outdoor na beira da estrada na entrada de Curitiba entre anúncios de motéis. Estavam nas proximidades do bairro Santa Felicidade.

O primo de Otávio prestava mais atenção na estrada e no som que rolava no carro, mas foi subitamente interrompido.

Quando viu Otávio desesperado, o homem tirou sua mão direita do volante, esticou o braço e deu um pause no som.

- Otávio, esse é o Chip´s of Love ué!
- O que? Mas que porra é essa? – gritou novamente.

Então o primo disse:

“Olha só... imagine o seguinte: as empresas Tim, Vivo, Oi e Claro se juntam. Ok?” – Otávio faz positivo com a cabeça. “Essa junção é resultado de uma campanha integrada. Um laço pra operar apenas um produto. O nome do produto chama-se Chip´s of Love” – Otávio coloca os dedos na boca e rói. “Esse dispositivo permite a comunicação por mensagem entre aparelhos celulares. É um aplicativo em que todos que usam o código LOVE podem se comunicar entre si. O serviço não é gratuito. Inclui banda larga também. O diferencial é que este pacote é basicamente sexual. A finalidade é promover o sexo. Sacou?”.

Otávio treme.

- Você está bem cara?
- Estou... por favor. Por favorrrrr – com os dentes rangendo – continue...

“Bom... olha lá ein... você está bem mesmo?” – um sinal de positivo bastou. “Como eu já disse, a finalidade dessa parada aí é promover o sexo... e lógico... as operadoras estão mais bilionárias do que nunca! Essa campanha começou no Brasil, parece que a ideia é brasileira, mas já ganhou o mundo. Além disso, dizem... isso eu não sei se é verdade, mas dizem por aí que o índice de violência diminuiu e as pessoa transam mais. Basicamente é isso”.

- Porra! – disse baixinho Otávio ao olhar pro horizonte.

...

“Existem sensações e sensações. Algumas nos mostram como somos frágeis. Porém, a sensação de ser usado, de ser passado pra trás, de ser roubado; essa sensação é impagável. E neste caso, a única esperança – que surge através de uma sensação – é a vingança” – Otávio solta essas palavras ao vento. Nunca o vi com tanta lucidez.

- Qual o sentido da vingança pra você Otávio?
- Hoje... é ela que me faz levantar, vir até aqui. É ela que me leva pra casa. É ele que me faz sonhar. A vingança me mantém vivo.

...

Otávio chega ao bar. Seus passos não são lineares. Está desgastado. Lembranças, fantasmas, traumas... eis que tudo vem a tona. Já não está centrado como antes. O prazer o levou do céu ao inferno em pouco tempo.

- Por favor... whisky.
- Acabou o Buchanan´s.
- Pode ser qualquer um...

Otávio tinha suas manias. Quando queria comer em boteco ia ao Pudim. Quando queria beber com os amigos, ia ao boteco do Seu Laércio, próximo a sua casa.

Muitas vezes os companheiros de trabalho o acompanhavam. Todos gostavam de ouvir as histórias de sexo que Otávio Olavo contava. Era, muitas vezes, o motivo pro bar do Seu Laércio permanecer aberto madrugada a fora.

...

Otávio se contorce no banco do carro do seu primo, faz caretas e desfere palavrões ao vento do ar condicionado do automóvel. Mas não eram só palavras de baixo calão, tinham os acompanhamentos. Era tapa no painel do carro e soco no para brisa.

Então o primo de Otávio para o carro e fala nervoso:

- Olha aqui seu filha da puta, seu corno de merda – Otávio arregala os olhos e se assusta! O primo segue: cuidado com a porra do meu carro. Presta bem atenção... pra mim é bem fácil... é só eu dar meia volta e largar você naquela merda de prisão psiquiátrica novamente. É isso que você quer que eu faça? É isso? Olha aqui seu filha da puta... vou falar mais uma vez pra ver se você sacou a porra toda. Você quer que eu te deixe na merda do hospício novamente?
- Não não... calma cara... calma. Não precisa ficar tão nervoso assim. Desse jeito você está parecendo eu!
- Cara... não brinca comigo... faz dez minutos que você tá comigo e isso já é o suficiente pra você levar uma porrada.
- Calma cara... não precisa ficar tão nervoso assim! – grita nervoso Otávio.
- Só eu né? Só eu que to nervoso né? Você tá bem calmo dando porrada no meu carro né? Filha da puta...
- Porra... caralho... tá foda ein... cadê aqueles baseados que você fuma?
- Cara... você acabou de sair da merda de um hospício e vem falar em baseado... vai tomá no seu cu cara... vou te levar pro hospício de novo...
- Ei ei... não ligue o carro ainda... calma... calma...
Otávio consegue impedir que seu primo ligue o carro. Então pega a pequena bolsa que estava nos seus pés. Abre um zíper e puxa pra fora dela uma sacola de mercado. Ela está cheia de comprimidos.
- Que porra é essa? – grita o primo muito puto.
- Calma cara... calma... isso aqui é calmante...
- O que?
- É! Nós, internos, ganhamos de presente... sabe como é... lá dentro fazemos amizades né! E como eu saí de lá... ganhei uns presentinhos dos meus amigos. Esse remedinho me mantém calmo!

Então Otávio pega três e manda pra dentro.

- Meu deus... você é o mais maluco de todos! De todos os tempos!
- Calma cara... pega um pra ti de presente... toma aí... você precisa se acalmar.
- Isso é calmante mesmo?
- É... chamam de antidepressivo!
- Mas calmante e antidepressivo é a mesma coisa?
- Sei lá cara...
- Porra... então da mais dois aí...
- O que?
- Ué... se você tomou três eu também quero tomar três.
- Mas to acostumado porra... tomo essa merda todo dia...
- Porra... me dá mais dois... você acha que preciso ir pra um hospício pra tomar drogas? 

Me passa logo mais dois aí... ah... e outra coisa cara... já vou te avisar agora... lá em casa não vai ter folga pra ti não ein... o pessoal tá chegando na cidade pra ter ver... vem todo mundo.

Os parentes se acalmam, eles seguem até a nova moradia de Otávio: a casa do seu primo.