quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

Causos da desgraceira de loucos em plena guerra - Quando o homem e o animal se entendem



Ernesto andava na calçada, passos lentos, respiração congestionada, olhos baixos, em chamas. Não tinha aonde chegar, não sabia pra onde ir, mas seguia pela escura e calma rua. Suas roupas eram confortáveis, de chinelo. Mente em conflito, seus pés não estavam no chão. “Quero paz, preciso de paz. Não aguento mais esta prisão, sempre estou descontrolado. Acho que não. Mesmo preso faço a coisa certa. Será?” Falava sozinho:

- Hahahaha Como você é estúpido.
- Por quê?
- Ontem você poderia ter feito aquilo, mas não fez.
- Eu sei, eu sei que deveria ter feito. Mas você sabe o que eu pensei no momento.
- É, mas agora você já não pensa mais da mesma forma.
- Eu sei. Novamente você tem razão. No momento eu achava a coisa certa a fazer. E fiz. O que há de errado nisso?
- Nada. Não há nada de errado. Você não prejudicou ninguém. Aliás, não tem porque isso acontecer, mas novamente você saiu prejudicado. Novamente não falou o que pensava, não estabeleceu o que realmente você é, o que realmente pensa. Não é?
- Às vezes eu penso que sinceridade é algo tão estúpido.
- Mas você é um estúpido.
- Eu sei. Você também é.
- Droga!!!! Esse cachorro não para de latir no meu ouvido. Que bicho bravo!
- Talvez ele esteja querendo chamar atenção.
- É, mas acabou interrompendo nossa conversa.
- Eu vou ver “qualé a desse” fila nervoso.

Ernesto, após conversar durante alguns quarteirões, foi interrompido no portão de uma casa. Ele estava conversando, agora, com o cachorro.

- Pra que latir alto assim? Porra! Logo pra mim. Você não está vendo que estou sossegado, só estou dando umas “banda”...

O cachorro latia com mais fúria.

- Porra meu! Para de latir. Você está com fome? Quer que eu acorde seu dono?

O animal pulava muito, queria desesperadamente, raivosamente, arrebentar aquele portão de ferro.

- Calma meu! Por que você está nervoso assim? Por que está preso? Por que não pode sair? Dar umas “banda”? Está com inveja de mim? Eu posso andar sossegado, mas também estou preso, acho que estou ficando meio louco. Na verdade veio, “EU TÔ MUITO LOKO”... hahahahahahahaaa...

O cachorro estava babando, batendo sua cabeça nas grades, completamente alucinado.

- Já sei o que vou fazer por você meu chapa! Vou libertá-lo, vou me libertar. O que você acha? Quer sair desse pátio e andar pela cidade olhando pra lua e pensando na vida? Vamos lá, eu vou ajudá-lo. Você quer?

Colocou a mão no portão, que não tinha cadeado, somente a tranca convencional.
O cachorro estava quase abraçando Ernesto, entre as grades, aquele animal enorme fazendo o possível para se saciar.

- Calma! Calma! Já vou abrir, estou quase conseguindo...

Abriu! Levou uma patada na seqüência. Ernesto caiu violentamente e bateu a cabeça. Desmaiou. Não sangrava. Depois de algumas horas...

- Droga! Cadê aquele vira-lata covarde?

Então olhou pro lado. Lá estava o fila e sua cadela deitados, abraçados e acordados.

Após perceberem que Ernesto havia despertado, levantaram, abanaram o rabo e foram dar umas “banda”.