quarta-feira, 30 de julho de 2008

“Existe um ritmo em nossa cultura, sei que existe, e eu, sendo um criador, tenho o poder de escolher meus próprios direcionamentos” - Dódi Hernandes.

...

Dódi estava a refletir no trono há mais de meia hora quando foi interrompido por sua namorada Catarina:

- Dodiiiiiiii (berra Catarina) – sai logo desse banheiro, tá pensando que é sua casa? Tenho que usar também né.
- Pô gata... tô saindo...

E saiu... ficou nervoso. “Viu só, é como eu estava falando, nem no banheiro eu posso ficar sossegado”.

*

Dódi Hernandes vai pra casa, que não é sua e sim de uma tia que não o esculacha, pois sabe que ele é uma raridade entre nós. Mas se você pensa que ele é um ferrado e sem dinheiro... está quase certo, pois ele sempre tem uma carta na manga pra te mostrar... ele sempre conta... ele é a cara da nova era... da era do nada... da era que ele vive... a era que o que você cria hoje, amanhã já era.

*

Desta vez deu tempo pra Dódi abaixar sua cabeça, colocar o dedão e o dedo indicador entre os olhos, no início do nariz... fazendo pose de reflexivo (ele sempre faz isso, fica uns dez segundos pra daí iniciar suas reflexões):

“As semelhanças das criaturas não estão apenas nas necessidades, me parece que a sociedade já está saturada de si. Por isso a construção de cada ser humano está cada vez mais absurdamente ridícula, já que estamos na era dos jovens teleguiados.

Vivo num tempo em que o belo, o popular, o clássico, estão parecidos! Por isso tudo é tão ridículo Poderia ser diferente? Sei lá, essa é a era do sei lá, do acho, do talvez... sabe... do tô nem aí... no entanto considero as fugas da realidade, o imaginário, como começo mais eficaz da destruição dos meus inimigos. Quantas vezes eu fiz e quantas vezes ainda farei...”.

- Hum... saquei Dódi. Lembro de quando eu era menino e tinha um homenzinho dos Comandos em Ação, ele me levava pra outros lugares cara! Indescritível! Ficávamos horas brincando – esse é Jorge, fiel ouvinte de D.H, esse que odeia ser interrompido, mas desta vez deixou o amigo continuar...
- Aquele boneco era como uma substancia, ele me levava pra outras estruturas. Sério mesmo Dódi, com ele eu fui jogador de futebol, comedor da mulherada, o maior roqueiro da história!
- Chega Jorge! Parou aí... deixa eu continuar de onde parei... mas aí... o que você disse faz sentido entende... é por aí...

Quando Dódi elogia Jorge é como se um presente fosse entregue ao jovem... até porque Dódi já passou faz um tempinho dos quarenta e seu amigo não chegou aos trinta. D.H. continua sua reflexão... sempre faz seu ritual, dedos na cara, cabeça baixa e aproximadamente dez segundos antes de começar seus contos. Um existencialista:

“Estou num patamar tão elevado em minha vida que posso afirmar: encontrei uma realidade irreal e paralela! Hoje posso suportar ser interrompido nesses momentos, suporto ser surpreendido. Sabe Jorge, antes era como um estupro de algo íntimo e importante que jamais poderia ser violado por forças exteriores”.

*

Com o passar dos anos Dódi ficou mais flexível. Mas será que as fugas estão acabando? Estamos sérios demais? E Dódi Hernandes, será que ele tem alguma ambição? Não sei, mas esqueçamos que podemos ser melhores ou piores. Consideremos muito insignificante definir a vida, pois essa ultrapassa a barreira do tempo.

*

“Eu sei da tendência do ser humano em buscar aquilo que mais agrada seus interesses, por isso Nietzsche fala do gosto como se fosse uma praga, deixe me ver: (...) É preciso livrar-se do mal gosto de querer estar de acordo com muitos. Bem não é mais bem, quando aparece na boca do vizinho. E como poderia haver bem comum? O termo se contradiz: o que pode ser comum sempre terá pouco valor (...)”.

Quando D.Hernandes acha algo interessante em livros que lê, normalmente escreve em cadernos que estão espalhados pela sua casa, além das suas próprias composições, porém essas, normalmente, ele prefere lançar ao vento como se fosse um profeta desse nosso tempo.

Se estiver falando sobre algo mais aprofundado, teorizado vamos assim dizer, é porque sua tia está presente. Não que ela apareça pra cobrar seu aluguel ou algo assim, mas ela gosta quando Dódi navega por águas mais profundas.

D.H. ergue a cabeça com os olhos esbugalhados, chega a assustar Jorge e sua tia – que agora também está na casa – porém não perde o compasso:

“Popular fica sendo simpático ao povo, do povo, faz parte das tradições, do conjunto de indivíduos que se comunicam inseridos em contextos regionais e compartilhados por muitos. Será? Vamos escrever”.

Em forma de exercício D.H. estende lápis e papel aos seus convidados – Jorge e sua tia – esses se olham assustados. A tia de Dódi interrompe o processo:

- Dódi querido, fica pra outra hora tá bom. Só vim conferir se está tudo bem, trouxe umas frutas, estão na geladeira... beijo.. fui...
- Ei irmão... vou nessa também beleza! Não quero atrapalhar seu ato de escrever, fica a vontade viu... escreve aí... abraço.. outra hora apareço...

E agora Dódi! O que fazer? Nesse momento só o imaginário pode falar. Só ele pode querer que algo surja.

*

Maldito é o fruto que desfruto todo dia
Interminavelmente agoniante
Refletindo me mostrando o que eu já sabia
Amaldiçoado propositalmente

A criação de símbolos representa a verdade?
Acredita fica com medo mas não sente
Tem medo e esperança conseqüentemente
Ao instinto a ganância naturalmente

Sabe o que é? O que representa?
Por que haveria de ser ou representar?
Vai dizer que não se sente apodrecendo
O irreal absorveu seu paralelo olhar?

Eu quero uma realidade paralela ao irreal
Muitos universos conseqüentemente
Realidade irreal maldita e paralela
Há possibilidade de torná-la uma mentira...

D.H.

*

Com os cotovelos apoiados na mesa fico lembrando o que acabou de acontecer. Fiquei olhando meus objetos: mesa, toalha, jornal, açúcar, térmica com café, faca, cinzeiro, caderninho, caneta, papel de pão. Olho pra cada um deles. Agora olho pra todos ao mesmo tempo e começo a ligá-los: isso completa isso, aquilo junto com isto. O café no copo... esse tipo de conexão originou diversas imagens, uma caminhando em direção a outra.

As toalhas pegaram a térmica, colocaram café no copo, limparam o que derramou. As mesmas toalhas limparam o açúcar que adoçou meu café, que caiu na mesa e foi limpa por causa das formigas! Elas novamente limparam a mesa quando o café derramou e percorreu um trecho pequeno, até atingir o jornal. O jornal! É, molhou a capa. Quase todas as capas. Um pouco das outras páginas. Café quente, forte, amoleceu o papel jornal...

Um bom café levou-me a olhar pro jornal. Aí me perguntei:

Crio algo?

Sei que quero me comunicar, não importa a forma. Faço parte de uma rede de informações. A forma é essa: comunicação. Direcionada pra todos os lados. Ferramentas estão disponíveis? Estou as utilizando? Faço à resistência? Os debates? As opiniões? Necessidade de informação? Busca de respostas? Busca de explicações?

Da mais medíocre palavra, até o mais belo dizer, do mais nojento assunto, até o que mais me convém. Assim é o reagir. Por isso a comunicação é uma resistência. Idéias que explicam, criticam, complicam e compartilham um conjunto de idéias individuais que, se questionadas, serão nosso consenso.

Mais um gole de café e respondo a minha pergunta:

Não é tão óbvio assim.

D.H.

6 comentários:

  1. Oie...
    Gostei... achei Dodi Hernandes interessante.
    De onde tu tirou esse nome?! heheh...
    Parabéns ta mto massa!
    Bjão

    Deise

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  2. Oiiii. Pelo jeito tivemos transmimento de pensação... ops... transmissão de pensamento... fiz meu blog essa semana... e pelo jeito o seu é novo tbém!
    Qdo eu descobrir como colocar links de outros blogs vou adicionar o seu...

    Bjão!!!

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  3. Olá cara,
    como sempre muito intenso e com escapadas imaginativas que possuem o poder de transportrar quem de vc se aproxima.
    O DH está sufocado mas ainda não percebeu..
    Abraços,
    Irajá

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  4. Demoro maluco pra fazer isto...hehehehehe...parabens... vamos ficar no aguardo de novas postagens...heheheheh....ja ta no favoritos vou ficar de olho...abraco

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  5. Luciano :Qué isso careca!!!!mandou muito bemm!!!!

    ta pensando agora ai..hehehhee

    olha bom trabalho mano sucesso ai

    pra ti meu e um grande abraçooo!!!!

    vlw irmão..

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  6. Sempre com ares - toscos - marcantes.

    Descrições detalhadas de como as coisa parecem imundas, nuas e cruas, escarradas e cuspidas.


    Te desejo muito mais boms leitores do que sorte..

    Dé!

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