terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Demonstração de liberdade? Sei lá... dá mais uma pinga



É só parar de ir ao boteco pra sentir realmente sua falta. As discussões são diferentes! Primeiro: lá discutir sóbrio não é lá grande coisa. Segundo: por lá os sóbrios são os chatos que discutem por qualquer coisa. Terceiro: lá os embriagados transformam qualquer assunto em algo mais dramático.

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“Novamente sozinho aqui nessa cidade. O som continua e a busca por euforia também. Preciso mirar um lugar e simplesmente entrar”. Uma desculpa às vezes é o cigarro solto, então passo em vários bares e não há uma pitada avulsa. A persistência faz com que eu chegue num boteco em que diversos senhores com seus chapéus e poucos dentes se reúnem.

Entro na boa e pergunto: “aí tem cigarro solto?” – “tem” – responde o cara do bar (magro, voz rouca e cara de poucos amigos). Eu também não estou a fim de mostras os dentes, pego o cigarro, acendo e peço uma gelada.

Alguns coroas jogam carta, outros sinuca. Falam e dão risada. Eu não presto atenção em nada, só penso em como conseguir humilhar alguns filhos da puta por aí. Quero os figurões do alto escalão mesmo. Aqueles que escapam da Polícia Federal, que são políticos e donos de escritórios de advocacia. Donos de meios de comunicação. Que dizem perdoar o povo e os deixam cada dia mais ignorantes.

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Viva a democracia. Dai-me uma pinga, por favor! – virei! Uma martelada na mente.

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Percebi que olho a fumaça no bar, ela sobe e faz uma espécie de camada ´nicotinoza` sobre nossas cabeças, em que a luz é como o sol, mas só ilumina o suficiente pra deixar o ambiente ainda mais cinza.

“É fumaça né mininu!” – disse um senhor pra mim. Estava ao meu lado e nem percebi. “Pois é!” – respondi. Olhei nos olhos daquele homem, estavam vermelhos e embriagados. Com um chapéu preto, camisa xadrez velha e calça jeans suja, simplesmente fazia como eu... olhava pro nada.

Acendi mais um cigarro. “Isso! Fuma mais!” – o senhor disse – “por quê? Quer um?” – “não! Parei!” – “que bom pra você” – “sabe como?” – “não”.

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“Veja bem, um senhor com mais que o dobro da minha idade aparece em meio à fumaça e vem me dar lição?” – isso foi o que pensei. Também quase conclui que estava no boteco errado. Fiquei a fim de comprar uma carteira de cigarros e sair fora, mas o cara conseguiu fazer com que eu o escutasse.

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“Na época eu morava num apartamento aqui perto mininu! Aí quando cheguei em casa numa dessas madrugadas da vida, não tem? Percebi que estava tentando abrir a porta de casa com meu charuto! Visse só! Charuto grande de fumar, não tem? Pois é, desse aí mesmo! E eu tentava abrir a porta com um desses aí!” – “certo, mas e daí?” – perguntei discreto. “Daí que eu percebi que tinha fumado a chave do meu apartamento visse!”.

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Não aguentei! Quando vi aquele senhor dando gargalhada da pegadinha, também larguei o riso. Aqueles poucos dentes a mostra, rosto surrado, mas com a língua sempre pronta. “Sabe mininu, é assim memo!” – depois disso já fiquei mais a vontade. Aquele senhor era realmente bom de conversa.

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Um velho gordo errou a tacada na bola oito e o adversário acabou com o jogo. O gordo foi até o balcão, pediu uma cerveja, o velho do meu lado piscou pra mim e soltou. “Esqueceu de trazer o zóio pro jogo amigo?” – disse pro gordo. “Não vem não Olivério, não vem encher meu saco!” – respondeu o gordo.

“Dá próxima vez tem que jogar com o zóio, senão vai perder sempre! Visse!” – “Eu enxergo muito bem obrigado” – e o bar todo caiu na gargalhada. O gordo continuou: “e tem outra, ficar andando com os óculos por aí é um saco, uma merda! Não é?” – “é mesmo, mas tem coisa pior, não tem?” – “deve ter” – eu disse baixo e discreto pro Olivério, nome do velhinho ao meu lado.

“O fofão! O fofão!” – Olivério chama o gordo – “O sherek! O sherek! Lembra daquele ogro verde do filme, parece não?” – disse e apontou pro gordão. Aí o cara veio na nossa direção e me disse: “esse magrelo é a pior invenção que deus botou na terra, pode ter certeza! Ele é muito chato!” – “eu sou a pior invenção é? Qual é a melhó então? Se sabe pode ir falando!” – “lá vem ele” – disse o gordo.

“Qué sabe qual é a melhó?” – “lá vem a bomba!” – disse o gordo pra mim. “A melhor invenção de deus foi o saco visse!” – “sabia que vinha merda” – soltou o gordão. “Ih num é? Ih num é?” – olhou pra todo mundo no bar, que naquela altura prestava atenção em Olivério. “Si num fosse o saco se ia tá andando com as bola na mão! Visse!” – e caiu na gargalhada, acompanhado pelo boteco todo. “Você ia se um que não ia te bola! Não ia fudê, não ia fazê nada! Já depende do zóio, ia perde as bola loguinho num é... ou ia saí na rua com as bola na mão, pra não perdê” – e dava risada. Aliás, não tinha como ficar sério com o nobre amigo.

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Naquela altura eu já estava satisfeito de ter achado aquele boteco. O dia estava ganho. Depois de ver e ler os jornais. Operações da Polícia Federal, governos e governadores por aí. Uns perdoam outros se desculpam, os temas são os mesmos. Nós continuamos a não alcançar o pescoço desses porcos.

Dói sentir e ver a impunidade mais uma vez, aí vemos a corrupção tão poderosa quanto essas enchentes que destroem tudo por aí. Já não sei mais pra que lado ir...

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Antes de Olivério levantar, pegar sua bicicleta, abanar pra todos com seu chapéu, despedir-se. Ele, como se fosse desvendar minha frustração, olhou e disse:

“Sabe mininu, eu so pobre, mas so feliz. Eu sempre fui livre. Sempre fui barbuleta. Sabe por que? Porque não nasci pá se larva. Quem nasce pa se larva nunca vai se barbuleta!” – virou as costas e saiu embriagado, depois de ajeitar o chapéu.

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Demonstração de liberdade? Sei lá. Mas parece que estamos aos milhões confortáveis em nossos casulos insignificantes – larvas insignificantes. Já as borboletas, as mariposas e seja lá o que mais que voe por aí... estão livres, ricos e soltos...

6 comentários:

  1. Cachaça goela a baixo, lorota e histórias boca à fora!

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  2. hehehe, esse olivério deve ser uma figura, uma espécie de primo distante do mazaropi...

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  3. boa boa ... se ta onde careca? em cascacity?

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  4. to em santa catarina por enquanto
    severino!!!!!!!!.. rs...

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  5. Muito massa...
    Só queria saber qual era o boteco????rsrsrs

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